Plataforma digital não pode operar transporte interestadual sem regime jurídico dos serviços.
Um desafio ao modelo de negócios da Buser, empresa de transporte compartilhado de passageiros, que utiliza a plataforma digital para conectar passageiros com motoristas. A 4ª turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) expediu sentença que suspende a atividade da empresa, considerando a prestação de serviços de transporte interestadual sem adequação às normas legais e regulamentares, o que configura transporte clandestino incompatível com o regime jurídico dos serviços públicos delegados.
A suspensão da atividade da Buser foi determinada após a conclusão do colegiado de que a atividade da plataforma configura transporte clandestino, considerando que não há registro na ANTT para os serviços realizados. Isso significa que a empresa não tem a autorização para realizar esses serviços de transporte, o que é ilegal. Além disso, a empresa não cumpre com as normas e regulamentações legais, o que é incompatível com o regime jurídico dos serviços públicos delegados. Portanto, a Buser não pode intermediar o transporte sem ser multada por descumprimento de normas legais e regulamentares.
Transporte: Novas Tecnologias e Regime Jurídico dos Serviços
O que levou a desembargadora Federal Simone Lemos a reformar a decisão inicial, afirmando que a atividade da Buser configura intermediação de transporte clandestino, ‘incompatível com o regime jurídico aplicável aos serviços públicos delegados’?
A desembargadora Simone Lemos destacou que ‘na esfera do serviço público, ainda que delegado, não há liberdade para se fazer o que não se encontra regulamentado’. Além disso, o modelo de negócios da Buser promove ‘concorrência desleal’ com empresas concessionárias regulares que cumprem obrigações normativas destinadas à prestação universal e contínua do serviço.
O fretamento coletivo em circuito aberto, praticado pela Buser e suas parceiras, viola normas previstas no decreto 2.521/98 e na resolução 4.777/15, configurando ‘utilização ilegítima de trechos cobertos por operadores regulares’. Além disso, foi destacado o desequilíbrio na ordem econômica e a ofensa ao princípio da isonomia, uma vez que concessionárias regulares são obrigadas a atender rotas não lucrativas, conceder gratuidades e manter serviços de atendimento ao consumidor, obrigações não observadas pelas parceiras da Buser.
A magistrada também abordou o impacto de novas tecnologias no setor, afirmando que ‘a natureza do serviço deve ser identificada sem ginásticas semânticas’. Segundo a magistrada, ainda que intermediado por plataformas digitais, ‘o transporte clandestino continua sendo clandestino e deve ser tratado como tal’. Ela citou o ministro Sepúlveda Pertence para reforçar que avanços tecnológicos não eximem a necessidade de adequação às normas vigentes: ‘A invenção da pólvora não exigiu uma nova tipificação do homicídio. Transporte interestadual de passageiros continua sendo transporte interestadual de passageiros, ainda que intermediado por plataformas tecnológicas’, concluiu.
O colegiado reformou a sentença que concedia a ordem por ausência de direito líquido e certo, reafirmando a necessidade de respeito às normas que regem o transporte rodoviário interestadual. Processo: 1027611-88.2020.4.01.3800 Leia a decisão.
Fonte: © Migalhas
Comentários sobre este artigo