Nota do Instituto, de outubro passado, analisou perfil racial de réus por tráfico nos tribunais estaduais de Justiça, Lei de Drogas.
De acordo com a pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a população negra é mais frequentemente detida por tráfico de drogas em flagrantes resultantes de rondas policiais. Essa abordagem das polícias militar e civil é baseada no que é considerado um ‘comportamento suspeito’ por parte do acusado.
Essa análise aponta para possíveis falhas, incluindo um viés racial, na aplicação da Lei de Drogas, de 2006. Em um momento em que o debate sobre adaptações e interpretações da legislação de drogas está em pauta, é fundamental revisar e repensar essas práticas para garantir a igualdade perante a lei.
O que o estudo analisou?
A recente análise realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) abordou o perfil racial de pessoas acusadas de tráfico de drogas perante os tribunais estaduais de Justiça comum. A amostra totalizou 5.121 acusados, baseada em um total de 41.100 ações, com sentenças no primeiro semestre de 2019.
O estudo revelou que a maioria dos réus é composta por jovens (72% com até 30 anos), do sexo masculino (86%) e com baixo nível de escolaridade (67% não completaram o ensino básico). Dentre os processados, os jovens negros com menos de 30 anos representam 50%. Esses resultados evidenciam a maneira como a criminalização por tráfico de drogas afeta essa parcela da população, conforme a pesquisa.
Essa análise se baseou em um estudo prévio lançado pelo Ipea e pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senad-MJSP). No referido estudo, dos réus condenados por tráfico, 30% afirmaram que a substância seria para uso pessoal e quase metade alegou ser usuário ou sofria de dependência.
Quais as principais conclusões da nota?
Entre os acusados, 46,2% são negros e 21,2% são brancos. Os crimes previstos na Lei de Drogas são apontados como responsáveis pelo processamento e encarceramento, de forma predominante, de indivíduos negros.
Uma análise adicional indicou que, entre os presos em flagrante, após abordagem baseada em comportamento suspeito, 51,3% são negros e 20,3% brancos. Para detenções em vias públicas, essas porcentagens são, respectivamente, de 52,8% para negros e 20% para brancos. Estes números sugerem uma maior propensão de pessoas negras a serem abordadas em situações de policiamento em comparação com pessoas brancas.
Quando as prisões estão relacionadas a investigações prévias e não a abordagens policiais por comportamento suspeito, há um equilíbrio maior na proporção de réus negros (36,9%) e brancos (23,9%).
Segundo a pesquisa, quando ocorre a entrada na residência do acusado com mandado judicial, as proporções de brancos (30,2%) e negros (34,7%) se aproximam.
Identificou-se, contudo, que a maioria dos casos de entrada em domicílio, sem ordem judicial, envolve pessoas negras (46,1%), enquanto 22,4% são referentes a pessoas brancas. Este cenário suscita a conclusão da relevância da raça na compreensão dos processos de criminalização secundária por tráfico de drogas.
O que o Congresso e o STF discutem?
No âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), está em pauta a possibilidade de o porte de maconha para uso pessoal deixar de ser considerado crime e, em vez disso, ser tratado como uma questão administrativa. O julgamento ainda não foi concluído, e o placar atual é de 5 votos a 3 a favor da descriminalização. Desse modo, os ministros da Corte já atingiram maioria para a implementação de critérios baseados na quantidade máxima de gramas de maconha para distinguir entre usuário e traficante.
Por outro lado, no Congresso, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e senadores tanto da base aliada ao governo do PT quanto de oposição são contrários a esses pontos. Eles defendem a votação de uma proposta que visa incluir na Constituição a criminalização do porte de qualquer tipo de droga, independentemente da quantidade.
Atualmente, o uso de drogas é considerado crime, mas não implica em prisão para o usuário, enquanto o traficante, de acordo com a legislação, deve ser detido. A Lei de Drogas prevê punições alternativas, como advertência e prestação de serviços, para a compra e o porte de substâncias ilícitas para uso pessoal.
A nota emitida pelo Ipea revela que os casos de apreensão de até 25 gramas de maconha resultam em 47,2% de acusados negros e 19,2% de acusados brancos. Este panorama destaca as disparidades relacionadas ao tráfico ilícito.
Fonte: G1 – Política
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