Manter o sobrenome é direito de casado, ainda que haja violência doméstica.
Ao longo da história, a luta pela dignidade feminina tem sido um tema recorrente, especialmente no contexto de violência doméstica, que afronta o direito à dignidade humana de uma maneira profunda e perturbadora. A manutenção do sobrenome da ex-mulher pelo ex-marido, em situações onde o relacionamento terminou em meio a demonstrações de violência doméstica comprovada, não apenas viola esse princípio fundamental, mas também reflete uma falta de respeito pela dignidade da mulher, perpetuando uma dinâmica de poder desequilibrada.
O conceito de dignidade humano é amplo e complexo, envolvendo a capacidade de ser tratado com respeito e reconhecimento em sua autonomia, dignidade e valor. Quando uma mulher se encontra em uma situação de violência doméstica, sua dignidade é atacada de diversas maneiras, desde o uso da força física até a violência psicológica. A manutenção do sobrenome, nesse contexto, pode ser vista como uma forma de continuidade dessa violência, negando ao ex-marido a dignidade de ser reconhecido como único detentor do sobrenome, mantendo assim, a opressão e desrespeito ao direito à dignidade humana.
Violação da Dignidade e a Luta por Direitos
Em um caso emblemático, a 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) decidiu que o sobrenome de uma mulher não pode ser mantido pelo seu ex-marido agressor. Essa decisão foi tomada após o Tribunal conceder provimento ao recurso especial de uma mulher que buscou obrigar o ex-marido a excluir seu sobrenome.
O caso envolvia um casal que havia trocado sobrenomes durante o casamento. Quando o casal se divorciou, devido à denúncia de violência doméstica, o juiz autorizou a mulher a voltar a usar seu nome de solteira. No entanto, o pedido para que o ex-marido excluísse o sobrenome da mulher foi silenciado. A ex-mulher apresentou um recurso, argumentando que a manutenção do sobrenome a ofendia diretamente, violando a sua dignidade.
O desembargador Pastorelo Kfouri, relator da apelação, ressaltou que o caso apresentava um conflito de interesses. O ex-marido argumentava que a mudança afetaria negativamente sua carreira profissional, pois é conhecido por esse sobrenome. No entanto, a ex-mulher havia sido vítima de violência doméstica e, portanto, seu interesse devia prevalecer.
A decisão do desembargador foi baseada na proteção à dignidade da pessoa humana, que é um princípio fundamental da Constituição. A ex-mulher não deveria ser forçada a suportar a manutenção do sobrenome de um homem que a havia agredido. A argumentação do desembargador justificou a superação de uma jurisprudência preexistente, que afirmava que a exclusão do nome de casado só poderia ocorrer por opção do próprio cônjuge, por se tratar de direito potestativo.
O desembargador também destacou que o prejuízo financeiro sofrido pelo ex-marido não deveria ter maior relevância em relação ao prejuízo moral sofrido pela ex-mulher. A manutenção do sobrenome era uma nova agressão contra ela e violava sua dignidade. A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo é um passo importante na luta pela proteção da dignidade das mulheres vítimas de violência doméstica.
Fonte: © Conjur
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