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Da adolescência egoísta ao amor materno – uma jornada difícil transformou-me. No Ritmo da faculdade, a música continuou a cena do filme verdade. Devolver a visão, pensamentos capacitadores.
Há alguns dias, assisti ao filme ‘No Compasso do Coração’ que narra a história de uma família com pai, com deficiência. Todos colaboram em conjunto e a filha adolescente, a única que enxerga, desempenha o papel de ‘traduzir’ o mundo para os pais e o irmão e vice-versa. Quando ela se aproxima da idade de ingressar na faculdade, ela se depara com uma nova paixão: a música.
No desenrolar da trama, a protagonista se depara com desafios relacionados à sua deficiência visual, mas encontra forças para superá-los. Ela aprende a se expressar através da música e descobre um novo sentido para sua vida, inspirando não apenas sua família, mas também a comunidade ao seu redor. O pai, com deficiência, enxerga nela um talento especial e a apoia em sua jornada rumo à realização de seus sonhos.
Reflexões sobre a relação com meu pai, deficiente visual
Ela começa, então, a fazer aulas com o professor da escola até o momento em que ela precisa decidir: seguir a vida dela e o sonho de fazer a faculdade de música ou continuar ao lado dos pais. Esse filme mexeu MUITO comigo porque eu sou filha de um pai com deficiência. Meu pai era cego, e eu me vi muito na protagonista, em todos os momentos que ela tentou fazer o mundo mais acolhedor pra família. Tem uma cena em que o pai pede pra ela cantar uma música pra ele e, quando ela começa, ele coloca as mãos na garganta dela pra sentir a vibração da voz. Ele, sem conseguir ouvir o som, encontrou um jeito de sentir a voz da filha e entender a paixão dela por aquele território desconhecido. Eu acho que nunca chorei tanto em uma cena de filme. De verdade. Inclusive tô chorando agora só de lembrar e escrever aqui pra vocês. Não vou mentir: dói demais saber que o seu pai ou sua mãe nunca vai conseguir te ouvir ou ver. É um sentimento extremamente egoísta que a gente tem quando é adolescente e sabe nada da vida. Eu tinha muita raiva. Frustração. Desespero. Tudo ao mesmo tempo. Queria, do alto da minha arrogância, resolver o problema. Dar um jeito de devolver a visão pro meu pai, sei lá. Tinha que ter um jeito. Eu caí naquele pensamento capacitista de achar que ‘ele estava sofrendo e precisava de ajuda’. Só consegui me acalmar quando entendi que aquilo não era sobre mim. Eu percebi que doía mais em mim do que nele, e que a deficiência não definia quem ele era. Eu não tinha que sentir pena ou qualquer coisa parecida. Eu só precisava ser a filha dele, e fazer o possível pra entender que a falta de visão era só uma característica. Foi a partir daí que a gente aprendeu a conviver naquele novo cenário e a dividir momentos muito parecidos com os do filme. Por exemplo: toda vez que eu cortava meu cabelo, eu chegava do salão e ele me pedia pra passar a mão pra ‘ver’ o comprimento. Ou quando coloquei meu piercing no nariz e ele queria saber o tamanho (ele foi contra no começo, mas depois aceitou). Eu e meus irmãos também descrevíamos os lances dos jogos de futebol ou a aparência dos jogadores que ele mais gostava. Ou até mesmo a nossa. Meu pai perdeu a visão quando eu era uma criança, então quando eu entrei na adolescência, ele chegou a me perguntar ‘como eu era’. Eu peguei a mão dele e coloquei no meu rosto pra ele me ‘ver’ naquela nova versão. Foi assim que ele conheceu os netinhos também quando eles chegaram. Eu tive MUITOS momentos assim com ele. A gente aprendeu a encontrar maneiras de sentir um ao outro, de ficar o mais perto possível. Ele não queria perder nada, e eu não queria que ele se sentisse excluído do mundo. Foi assim que eu aprendi a valorizar momentos que muitas vezes a gente não presta atenção. Por isso, eu sempre falo que meu pai me ensinou muitas coisas. A principal delas foi:
Fonte: @ CNN Brasil
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